quinta-feira, 12 de julho de 2012

O ÁS de Ouro


















Pediram para eu não divulgar, só depois da Vitória, mas eu resolvi fazer o contrário, para que sirva de estímulo para muitos, que acham que por serem portadores de câncer, já estão condenados a uma vida apática, sem sentido, sem prazer... A minha nora com trinta e dois anos, foi diagnosticada com câncer de mama ductal infiltrante - grau II.  Como ser humano é claro que no momento que recebeu a  notícia desabou...Chorou o pranto dos que sabem do quanto essa doença, é perigosa e talvez pela cabeça dela tenha passado toda a sua história de vida. Estava acompanhada do esposo (meu filho) e da filhinha de um ano e nove meses... Foi um duro golpe para os dois, ela chorava e ele tentando reprimir  as lágrimas que teimavam em rolarem pelo seu rosto, tirando forças da fé, que ambos são movidos. Eles são nascidos na Bahia, mas, moram em São Paulo. Meu filho ligou para Salvador, queria falar comigo e com o pai- nesse momento  a força que ele pediu a Deus deve ter achado que viria através de nós.  Como eu já tive câncer (fiz colectomia total, o médico retirou todo o intestino grosso e o baço, imaginei logo todas as dores, sofrimentos e decepções que eles estavam por passar). Eu tinha ido a salvador no dia 31, fazer exames de rotina (desses nós nunca nos livraremos) soubemos da notícia por volta das quatorze horas e em menos de vinte e quatro horas -chegamos em São Paulo às onze horas da manhã- já estávamos com eles. Eu e  meu marido sabíamos das nossas limitações de saúde, portanto de todas as dificuldades que iríamos passar, aqui em São Paulo eles não tem ninguém. Pensamos em levá-la para a Bahia, mas os médicos acharam que pela gravidade do tumor  - nove centímetros - aqui teria mais recursos. E ficamos. As dificuldade começaram a aparecer. Fazia uns dois meses que ele tinha trazido as duas filhas do primeiro casamento para morarem com ele - A situação das meninas em relação a quem as olhassem estava complicada e ele de comum acordo com a ex- esposa resolveu trazê-las, até ela encontrar uma forma segura de deixar as meninas enquanto trabalhava. Era primeiro de junho quando chegamos, um frio intenso ao qual como baianos que somos não estávamos acostumados. Levantava às cinco e trinta horas da manhã (para mim que não estava acostumada a levantar cedo isso é madrugada- eu sou aposentada) para cuidar de colocar a neta do meio para ir à escola - meu marido ficou com a cozinha, coitado, corria, pois o almoço tinha que estar pronto impreterivelmente ao meio dia, quando a neta mais velha tinha que estar pronta, pois a perua que a levava para a escola não poderia esperar um minuto que fosse. Depois que arrumava a neta para ir à escola pela manhã, meu marido ia levá-la - morria de dó dos dois - um frio intenso, ela ainda dormindo agarrada á cintura do avô e lá iam os dois. Embora fosse muito puxado para nós eu tinha um grande prazer em arrumar minha neta, pentear-lhes os cabelos - essas duas criaturinhas sempre precisaram muito dos nossos cuidados. Voltemos ao assunto principal  -  a doença da minha nora. Com o frio e o próprio caminhar do tempo a coisa foi se agravando, as dores na coluna pioraram e ela não conseguiu mais levantar da cama. Veio a primeira quimio, (forte) por orientação da médica ela cortou os cabelos que eram bem compridos, lindos!!!  Fez um corte Chanel, que lhe emprestou mais beleza, eu fiquei encantada com o novo visual. Mas se o remédio é bom para cura, também é maléfico para o corpo e ela começou a sentir fortes dores e umas comichões na cabeça. Pensou bem, e resolveu como toda pessoa sensata, que estava na hora de decepar os cabelos - “Cabelo é raiz, e raiz cresce”- para o trauma não ser maior. Tem vezes que ela não consegue nem ir ao banheiro para fazer as necessidades fisiológicas e tudo é no improviso, não temos pessoas capacitadas em casa para cuidar de doente acamado - o marido se opõe ao uso da fralda descartável, acha que é traumático (pare ele) ela não faz restrições me diz que o importante é a comodidade.... Eu o entendo, quando eu passei por problema semelhante ele não tinha idéia do que o pai passava.  Mas deixa pra lá, o que quero enfatizar de fato, é a garra que ela tem de lutar. Ela ri, faz piadas comigo, diz que virei Anastácia, e preta velha, não tem cerimônia para pedir nada ao sogro que considera como um pai e carinhosamente o chama de “veio” Praticamente é ele quem cuida dela, leva para as consultas, a quimio, os exames e cuida dela em casa também, comida, na cama, virar etc.. Eu fico com a casa, a roupa e Maria a netinha – uma criança com energia demais e muito traquina, teimosa, tem que ficar de olho vinte e quatro horas, nunca tive um neto assim, vá entender logo num momento desses? Certo dia meu filho colocou um DVD evangélico - são evangélicos - e eu muito embora não tenha religião nenhuma, achei lindo ela assistir todo o DVD cantando, colocando os braços prá cima como forma de louvor, rindo, feliz na cama... Eu é que chorei - uma mistura de emoção e vergonha pela minha fraqueza espiritual. A criança é quem mais sofre, pois como viviam sós os três ela era apegada à mãe já que só ficavam as duas em casa numa cumplicidade ímpar.  Agora não pode estar todo momento com a mãe, mas mesmo assim damos um vacilo, e ela sobe pelos pés da cama, minha nora coloca-a na barriga, eu quero reclamar ela diz - deixe, e a menina faz carinho, e dorme que nem um anjo farta de um puro e satisfeito carinho. Mesmo com dores fortíssima não perde o foco na filha e me diz -  minha sogra faz uma sopinha  de verdura para Maria, me dê os legumes que eu corto aqui na cama mesmo. Que fantástico!!! Mas também é triste vê o marido encostado à cama dela sentado no chão com a cabeça junto dela - pusemos uma cama na sala para ela não ficar isolada no quarto. Bem, as outras netas foram passar as férias de julho em Salvador e a mãe entendeu que não dava mais para elas voltarem... Sei que realmente fez o certo, mas, me abalei profundamente, foi como da vez que vieram estudar aqui.  Elas já estão novamente estudando na Bahia. O pai choroso, pois esperou um dia morar com as filhas dele - o seu grande tesouro, Eu e meu marido continuamos aqui, mas não sei até quando  aguentaremos, pois a saúde já começa a gritar - quero atenção... Minha nora achou uma solução precária - ir para casa de uma amiga que ela morou quando veio para São Paulo - muito prestativa, a amiga ofereceu a casa dela e os préstimos enquanto vamos á salvador cuidar da saúde, mas a casinha é tão pequena, ela tem uma filhinha mais nova que a minha netinha, tem o marido e um filho adolescente.  O que mais me emocionou foi a solidariedade dessa amiga, já esteve aqui várias vezes, trouxe colchão, cobertor, e disse que cuidaria bem de minha nora até nós nos sentirmos melhores e medicados para voltar. Que grandeza! Com toda dificuldade que terá para acomodar uma pessoa doente em uma casa pequena mostrou que tudo é possível quando se tem vontade de servir e o coração é grande Meu filho está muito triste, pois a casa tem uma escada com muitos degraus e vai ter dificuldades para carregar ela para ir fazer a quimio, as consultas e os exames. Ela tem que sair pelo menos três  vezes no mês. Já mobilizamos toda a família em Salvador para  a famosa “vaquinha” - fizemos as contas e dá seiscentos reais de taxi. O que dói é ver meu filho estressado, e agora triste por não encontrar outra solução que não seja essa dela sair para uma casa de uma amiga onde terá dificuldade de mobilidade. Mas Deus é grande e a amiga já disse que na hora chama algumas pessoas para carregá-la. Ou quem sabe surge outra solução, mas a gratidão a amiga Adriana será eterna. Disso tudo aprendi a mais bela das lições até hoje em minha vida: De onde nada se tem é de onde mais brota solidariedade, compreensão dos nossos iguais. E a lição espiritual da minha nora - a força e a fé - nunca imaginei que tivesse tanta.

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