
Mãe de Gravata
Com licença Ronnie Von. Permita-me o uso da licença poética que leva o nome de um programa que você apresentou. Mas é por uma causa nobre. Aliás, é para que se faça uma justa homenagem a um cidadão que com dedicação, desprendimento e conformação virou uma mãe de gravata – nunca vi um nome tão apropriado para homens que tal qual você dedicou-se a cuidar dos filhos e ajudar nas tarefas domésticas.
Estou falando do meu Irmão Benedito – esse, não só é uma mãe de gravata, mas uma filha de bigodes.
Acredito que estou fazendo justiça ao prestar essa homenagem a essa criatura – embora tarde – mas como diz o velho jargão nunca é tarde para se reparar uma injustiça. E agradeço a Deus por ter me dado a permissão de prestar-lhe essa homenagem ainda em vida.
Benedito – Bené, como todos nós costumamos chamar-te. Você é um guerreiro de Deus. É fato que lhe vi cambalear algumas vezes, mas está tudo certo, errado seria se fostes toda uma vida uma rocha, uma fortaleza – não estou falando de nenhum ser sobrenatural, nem de super heróis das histórias em quadrinhos levados ao cinema em mega produções idolatrados pelas crianças, e adultos também - me incluo nesta última categoria, já que com os meus bem vividos 58 anos ainda continuo fascinada por estórias de super heróis. Sim, mas vamos voltar a falar do Guerreiro de Deus – o nosso super herói, que não voa, não escala edifícios, não tem máquinas motorizadas com tecnologia do futuro, nem porções mágicas, nem armas super poderosas. Suas armas são tão simples: aceitação, permissão, dedicação, poder de renúncia e muito amor que transborda e salta aos olhos diante de uma senhora indefesa, que não sabe quem é, quase que não fala – apenas canta, repetitivamente, ou balbucia? Na sua linguagem ininteligível como se fosse um besourinho zunindo, cumprindo o seu papel na natureza. Mas que você, somente você, consegue entender e discernir com tanta precisão, quando ela está alegre, quando está sentindo dor, enfim essa criatura tão amada, que tanto bem nos fez que como mãe muitas vezes nos livrou de castigos terríveis para não ver rolar as lágrimas de dor e frustração pelos nossos rostos, que tanta lição de amor, de cidadania de moral nos deixou como legados para nossas vidas. Hoje é ela quem te suga as forças. Outrora, já lá nos tempos longínquos, fomos nos que sugamos as entranhas dela a ponto de rasgar-lhe o peito. E quantas vezes saltaram-lhes as lágrimas ao rosto por te ver doente, e a nós, teus irmãos mais velhos? Sabe Meu Guerreiro, hoje fico a imaginar quantas lágrimas a fizemos derramar por pura estupidez. Infelizmente não me foi dada permissão de quedar-me perante ela, e aos prantos pedir-lhe perdão. Mas nem tudo está perdido, restou-me a felicidade de poder falar do meu amor por você, da minha admiração e dizer-lhe muito obrigada mano Guerreiro, por tudo que fez e faz por nossa “Menina Veneno” como diria se hoje aqui estivesse entre nós o nosso mano mais velho - Jorge. Não sei se hoje esse codinome caberia pra ela, talvez “Menina-viajante” se adequasse mais à sua realidade. Sinceramente, acredito que nós, os outros filhos, não teríamos essa capacidade se estivéssemos em condições físicas para cuidar-lhe. Sim, porque cuidar da nossa mãe não envolve só esforço físico, envolve renúncias, dedicação sem cobranças, e amor que mesmo no limite das suas forças e sanidade, emana de todo teu ser.
Às vezes fico observando você conversar com ela como se estivesse conversando com um filho bebê. Isso é mágico, é sobrenatural. Hoje a “Velha Nita” ou Dona Nitinha como você tão carinhosamente a chama é um apêndice do seu corpo. Acredito até que se um sente uma coisa o outro sente também, tanta é a comunhão dos corpos de filho que se tornou mãe e mãe que se transmutou em filho.
Eu sei Meu Guerreiro, que foi preciso renunciar a tantas coisas, buscar forças de onde nem você mesmo sabia onde e como tirar. Mas é claro que Deus esteve sempre atento, e não lhe deixou sucumbir. Combaliu por diversas vezes, mas nessas horas, como você escreveu uma certa vez uma mensagem para Cristiane – minha filha, lembra? Era uma véspera de Natal e você foi o amigo secreto dela - Deus te carregou no colo.
Sabe meu herói, a sua missão estava traçada desde quando seu espírito foi comungado com o seu corpo – Deus por certo disse “DESCE, FAZ TUDO QUE VOCÊ QUISER. TRABALHE, SORRIA, GRITE, ESBRAVEJE, BRINQUE, PULE, SALTE, FIQUE NERVOSO, RECLAME, CHORE... ENFIM, FAÇA TUDO QUE É INERENTE AO HUMANO, PORQUE NA HORA CERTA VOCE VAI ASSUMIR A MISSÃO QUE EU TE DESIGNEI. POR CERTO SERÁ ÁRDUA E MUTO DOLOROSA. MAS TENHA CERTEZA, SERÁ MAGNÂNIMA E GRATIFICANTE” E você fez de tudo, trabalhou, brincou, viajou, pulou, cantou, chorou, desesperou, duvidou contrariou, esbravejou foi arrogante, autoritário, cumpridor dos seus deveres para com a sua família e honrou enquanto pode todos os seu compromissos. Machucou muitas vezes alguém, se sentiu dono do mundo, e da razão. Mas tudo isso fazia parte do seu aprendizado para a missão que mais tarde Deus lhe cobraria.
E o retorno veio, é que o tempo de Deus não é igual ao nosso, e nós seres humanos somos “imediatistas”, queremos num curto espaço de tempo vê tudo solucionado. Somos homens de pouca fé.
A recompensa está chegando, não sei se você está percebendo, acredito que sim. Se não, vejamos:
Você foi abençoado com três de seus filhos – por enquanto, porque ainda faltam dois – ao passarem no vestibular em Faculdades públicas – além do ensino ser melhor. Será que se você estivesse empregado eles teriam tanta garra para correr atrás do futuro? Afinal eles sempre tiveram tudo, escola particular, alimentação a mais variada e rica possível, sem contar com a moradia espaçosa e confortável. Diz um velho ditado que tudo que é dado demais com muito trabalho por parte de quem dá, a pessoa beneficiada termina por se acomodar e não sair a procura da sua independência - é peculiar do humano. Quando Deus te chamou ao cumprimento da missão, muito embora de uma forma que nem você compreendeu - imagine os outros - Deus está sempre nos testando, vieram lamúrias, incompreensões, insatisfações e acusações pela perda do emprego por parte de todos, inclusive eu, engrosso essa lista. Pobres de nós! Que não conhecemos e nem procuramos se quer entender por pouco que seja a Obra Divina! E Deus entrou em providência para com a sua família – deu-lhes a garra de irem à luta “branca” em busca de um futuro melhor.
Continuando... Bené, o mundo espiritual é tão organizado que nós humanos jamais aprenderemos essa ordem, tamanha é a complexidade. Vejamos: éramos seis filhos. A mais velha apareceu com problemas no joelho, e praticamente ficou incapacitada. O próximo, Deus levou aos 53 anos sem saber da doença que acometeria nossa mãe. O próximo filho - outra mulher, caiu aos cinqüenta e seis anos, quebrou o fêmur - fratura arriscadíssima, corria o risco de nunca mais andar - e ainda quebrou o braço, outra fratura complicada que precisou também de cirurgia. Depois dessa, outra filha –Eu - aos 53 anos, um câncer que vem sendo até hoje monitorado, e não se pode dizer que esteja declarada curada. Teve trombose, e tem problemas sérios na coluna. O próximo irmão é uma pessoa que necessita de cuidados especiais, além de ser dependente, também tem problemas com várias doenças, sem contar que tem depressão-mórbida-crônica. Depois desse, o mais novo – Você, poucos problemas de saúde, teve a sorte de morar na Grande Salvador em um sítio, casa espaçosa - não interessa aqui detalhes da situação da mesma, o fato é que abrigou sua família por quase vinte anos com todo conforto – quem não gostaria de uma morada dessa? E agora quando três dos filhos já estão a meio caminho percorrido, Deus continuou entrando em providência com vocês – terão uma casa no centro e ainda terão outra em Lauro de Freitas. Talvez que o sítio já tenha cumprido o seu papel no tempo que se precisava de muito espaço. Tudo isso fruto do trabalho que Deus lhe permitiu ter até quando ele sabia que você poderia ficar, pois sua missão estava perto de lhe ser cobrada, e você não poderia estar empregado. Alguém precisaria demais de você, em tempo integral – O seu tesouro mais precioso depois de sua família - Nossa Mãe – alquebrada por tantos anos de trabalho pesado - carregar sacos de açúcar, trabalhar em pé no armazém, aturar a personalidade forte do nosso querido velho, e ter que caminhar e tomar decisões difíceis sozinha, sem o seu companheiro de mais de 34 anos. Os filhos reclamando a sua presença e ela era apenas uma, e todos a queriam. E por muitas vezes a fizeram chorar pelas brigas que travavam com ela pela disputa do seu colo – pobres órfãos-adultos-bebês”! Seria crível oh Deus! tanta irracionalidade em quem tem a capacidade do raciocínio? Como se não bastasse, o nosso irmão mais velho enveredou-se pelos caminhos do álcool que muitas vezes teve que ser internado em manicômios – Era um pedaço do coração dela que sofria e uma parte do seu cérebro que a tristeza ia apertando fazendo murchá-la. Ainda assim ela tentava ser forte, sem nosso pai tudo ficava mais difícil, porque ela já não tinha mais a presença alentada do Velho-Novo “Cota” - partiu muito cedo nosso “painho”, talvez que já avisado que você teria uma missão a cumprir e a presença dele talvez lhe dificultasse o cumprimento de tão sublime incumbência – para lhe ajudar na resolução dos problemas. E ficou sobrecarregada... E a cobrança vinha de todos os filhos . Eu ainda guardo na memória o medo estampado no rosto da minha mãe com a violência e autodestruição vindas a galope que ia tomando conta de Jorge. Veio nosso outro irmão, com problemas semelhantes – Mas esse não poderia ir embora, Deus o tinha escolhido como co-adjuvante. E que se faça justiça – filho aplicado e dedicado no seu papel de co-participante dessa missão para com a nossa Grande –menina - e as forças delas foram minando, o coração estava despedaçado, a dor das perdas, das saudades, e das nossas ingratidões iam pressionando cada vez mais o seu cérebro estiolado pela pressão de tamanho peso. Também vieram as doenças, aliás, doença é que não faltava nessa criatura - nossa “Mami” é um ser purificado através das doenças. Com tudo isso, só lhe restou fazer a viagem do mundo em tempo real para a volta ao mundo do tempo de criança. Ela decidiu esquecer para não sofrer mais, e com certeza pensou que não sofrendo, os filhos também não padeceriam ao vê-la prantear. Preteriu a vida em tempo real para o bem dos filhos. Chamou “Al” e”Zheimer” para ficarem com ela. Você bem sabe que ela não sofre, e isso pelo menos nos conforta.
Guerreiro, Guerreiro meu! Hoje eu gostaria de ser uma grande escritora, para deixar grafado aqui, coisas belas a seu respeito, mas escrevo com as minhas limitações de leiga e te digo: Muito Obrigada, meu irmão caçula, por cuidar com tanto amor, ternura, abnegação, sacrifício e renúncia da nossa querida mãe!
Te amo muito, e peço perdão pelas muitas vezes que o destratei, que não te compreendi.
Paz, harmonia, prosperidade... para você e toda sua família.
Força, coragem. Você já é um vencedor.
Beijos. Fica com Deus!
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